21/04/2010

Originally uploaded by Saloia

o quarto da minha avó materna na casa dela em Paredes do Vale

A alcunha da minha avó lá na aldeia era "Branquinha". Não tenho imagens dela quando era nova mas ela devia ter mesmo pele clara e olhos acinzentados. Agora quando ela fica comigo aqui em Sintra trocamos de cenario onde sou eu que a ajudo no banho porque com os seus já 98 anos está frágil e tenho medo que ela caia. Quando ajudo a secar as perninhas noto que elas são pequenas e brancas e de pele ainda macia sem rugas em contraste com os seus pés avermelhados e unhas com fungos. O banho acaba sempre com "Deus te abençoe minha querida, Deus te ajude."

Aminha mãe conta que as moças de Paredes do Vale fiavam e faziam as suas próprias meias que usavam no campo com as socas. Quanda vinha a primavera e a festa da Senhora do Vale (a freguesia mesmo lá no baixo da serra) iam com as pernas branquinhas e sem arranhões. Ao contrário delas, as moças do Vale já não as faziam as suas próprias meias e as pernas frescas das de lá de cima da serra que vinham dançar à festa eram a inveja para umas e a alegria para outros. Que orgulho elas sentiam!

Lembro-me que o irmão da minha avó, o Domingos ou Domenic como era conhecido em Jersey City, New Jersey, era também loiro e de olhos azuis. Quando visitava a irmã em Norwood, Massachusetts, faziamos grandes jantares de família. Ele era como um urso grande e gentíl. Lembro me que ele gostava de comer a parte do frango que tinha o «cu» (ponha toda a criançada a rir com a sua declaração à mesa) e gostava muito de apostar em corridas de cavalos. Tanto que o seu filho, também Domingos, quando obteve sucesso no trabalho comprou uns cavalos para este destino.

A filha do Domingos, a Mary, minha prima de 2ª conheceu a minha avó já mais tarde quando eu já era quase adolescente. Foi na primeira viagem dela à Portugal com o marido. Pediu ao guia da excursão em que viajava pelo Minho para desviar a carrinha até à aldeia onde nasceu o seu pai. Nós, a família estavamos todos lá a espera deles: avós, tios, pais, primos. Fizemos uma merenda minhota ao por do sol. Quando a Mary viu a minha avó apontou para os sinais vermelhos que parecem umas estrelinhas nas caras das duas e embora a minha avó não entender muito inglês apercebeu as palavras da minha prima. Apontou para a estrela na cara branquinha da minha avó e disse lhe "See, same thing, same thing." A minha avó respondeu -lhe com ar brincalhona...."same ting, same ting."

Em Julho vem a rolinha com a estrela na cara a Sintra mais uma vez. Com o ajuda de Deus.....

12 comentários:

polittikus disse...

Sabes adorei o teu blog, o nome é que engana um pouco, acho que devería ser a saloia doutorada. hehehe. Simplesmente adorei.

zira disse...

Que ternura!!! Que bom será os meus netos poderem um dia falar de mim com essa sensibilidade à flor da pele!!! Tenho três;8,3 e dois meses.Por isso o desbloquear da sua mensagem espectacular. Não só hoje...

Anónimo disse...

Mary,
Não imagina quanto eu gosto de ler os textos em que fala da sua família do Minho.
A "pureza" e a sensibilidade com que conta as histórias do passado e também do presente são enternecedoras.
O quarto da sua "rolinha" tem na janela duas conversadeiras de pedra....Bonito!
Um beijinho para si
emília reis

Luís disse...

Amor

Adoro sempre os pensamentos que deixas no teu blogue.

És tu própria, sempre muito genuína.

Luís

Isabel Marques disse...

a minha avó viveu connosco nos últimos anos da sua vida e quando eu estava por casa, era eu que lhe dava o banho, penteava-a e passava-lhe creme no rosto. No fim, também me dizia "Deus te abençoe".
tenho saudades dela.

Tereclopes disse...

Mais uma vez aqui venho dizer o mesmo: Mary já pensaste em escrever um livro?
Escreve que vai ser um sucesso, eu quero um...
Lindo!!!!
Beijinhos
Teresa

saloia disse...

Obrigada por partilharam os vossos pensamentos nesta viagem minha ...escrevo para a minha familia em boston e espero que eles gostam também.

mary

Flora Maria disse...

Lindo, Mary, muito lindo, seu texto emotivo e carinhoso.
A forma como trata a avó, as lembranças, os detalhes caprichados, tudo me encantou.

Beijo

Alix disse...

memories that are living again in your words. you have such clarity of detail, and understanding of people. you really are a story teller. thank you for sharing

Zita disse...

Fui forçada a comentar.

Este texto trouxe-me as lágrimas aos olhos, não sei porquê...
Se calhar sou eu que sou uma chorona... ou então têm uma mensagem simplesmente bela...
Eu vou continuar a vir, por favor não pare de escrever...

Beijos da Zita

Anónimo disse...

Lindo! Adorei a ternura e o carinho com que fala da sua avó. Já não tenho a minha há uns anos mas, ainda fez os 99 um dia antes do incêndio do Chiado. Também era muito querida e tinha "uns ditos muito engraçados". Bem-haja (à boa moda beirã)por ajudar a recordá-la.

saloia disse...

obrigada e um abraço :)